Impecáveis. Sem um fio de cabelo fora do lugar. Maquiagem sempre. Unhas? Bato ponto toda semana na manicure. Roupas sem um furo sequer, zero manchas, sempre passadas e cheirosas. Sapatos como novos, salto alto sem um arranhão. Aliás, salto alto, porque no meu trabalho mulher tem que ser elegante. Perfumada, porque não posso deixar de estar cheirosa. Rugas? Um horror, imagina se alguém descobre que estou envelhecendo. Peitos acomodados em bojos bordados que simulam…peitos. Mil cremes, diariamente. Uma fortuna no salão e na depiladora. Outra fortuna no Crossfit. Ainda cuido da casa, dos filhos, da roupa da família inteira, da comida, das compras, do cachorro que, aliás, está com a vacina em dia. O relatório entregue no prazo para o chefe, que ainda pontuou como estou sempre disposta e impecável. Impecável.
Não está errado gostar de tudo isso, mas fazemos porque gostamos ou por uma imposição social incutida no ser mulher e que convencionou-se sobre nós, que dão conta de tudo e ainda conseguem estar sempre belas e faceiras?
Esse papo rendeu no instagram ontem, sobre essa cobrança escrachada que as mulheres sofrem pela impecabilidade. Com isso, descartamos com facilidade, gastamos nosso dinheiro para mantermos um padrão imposto (desproporcional em relação aos gastos dos homens) e ainda sermos tachadas de consumistas. Se falarmos de mulheres negras, o recorte é ainda mais cruel, porque numa sociedade estrutural racista, significa inclusive correr riscos.
Tenho falado muito sobre sapatos aqui, né? Mas acho que as dúvidas e vivências vão ampliando nosso conhecimento e trocas.
Mostrei o icônico scarpin bronze, que aparece em vários looks meus desde 2013 e me perguntaram como faço pra manter o sapato intacto. Bem, ele não está mais 100%, como vocês podem ver, a parte interna esfarelou, mas eu continuo usando mesmo assim, porque a parte externa, apesar de alguns arranhados, ainda se apresenta com um aspecto usável.
Sinceramente, acho 6 anos pouco ainda quando falamos de tempo de existência de um produto. Salvo quando a pisada é forte e os sapatos desgastam mais rápido, por conta da obsolescência programada, que é um meio capitalista de garantir que os objetos tenha vida útil reduzida, seja estragando mais rápido ou apresentando tendências que sugerem mudanças o tempo todo, quanto menos tempo um objeto durar, melhor para o sistema, pois gera mais demanda pelo produto. Acho mais jogo fazer meu scarpin render que sair à procura de outro.
Mesmo com os arranhões e marcas de uso, não me importo de usá-lo. Não concordo com a máxima que as pessoas reparam tanto assim na gente e, se o fazem, desculpem, mas não compactuo com tamanho critério. Eu reparo no sorriso, no olho no olho, mais do que se a pessoa está vestindo algo que não está impecável. Sapatos sofrem com ação do uso e das calçadas, seria insano cobrar tanto assim o tempo todo.
Falei sobre descarte que conversamos aqui dos sapatos, sutiãs novos e velhos, usarmos mais o que termos e não naturalizarmos as marcas de uso, para nossa saúde mental, financeira e do meio ambiente. Questionar não é simples: comprar briga é difícil demais. Mas é lei. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/10) também institui a responsabilidade compartilhada entre Poder Público, fabricantes/distribuidores e sociedade. E a logística reversa é um instrumento para o gerenciamento dos resíduos sólidos. O comprometimento é de todos, tanto de quem compra quanto de quem fornece.
DICA PARA USAR OS SAPATOS ESFARELADOS
Uma dica que deram foi de lixar com uma lixa grossa a parte interna que estiver esfarelando dos sapatos, até todo material sair e pronto! Ou então usar uma meia fina tipo sapatilha, aquelas que protegem os pés no dia a dia, sabem?
Também disseram que sapateiras fazem essa função, forrando a parte interna com uma telinha fina de algodão.Vou testar com esse scarpin e conto aqui.
E se o pé fica sujinho com esse uso, sinceramente, acho que isso não é motivo de vergonha.
Mesmo que você não consiga usar por conta disso, se o aspecto estiver bom, é válido pensar em doação, inclusive para pessoas que precisam de pisantes para conseguir emprego e não têm dinheiro para sapatos novos, quanto os tênis de corrida, que podem ser doados para atletas de comunidades carentes.
No mais acho que podemos buscar mais por marcas que ofereçam a logística reversa: sei que a Melissa em SP, na Oscar Freire, tem caixa para receber melissas antigas e a Insecta Shoes também recebe em suas lojas e por envio aos correios.
Sutiã velho: uso muito
Pontuei também que os poucos sutiãs que uso e me sinto confortável, mesmo que mais velhinhos, eu uso sem medo de ser feliz.
O questionamento é válido para saber se usamos lingerie nova e bonita sempre porque GOSTAMOS e é pra gente, ou se para seguir essa imposição de agradar ao homem ou a imagem de impecabilidade que a mulher precisa passar. Quem nunca ouviu da avó a história de estar sempre com uma lingerie bonita por baixo caso sofra algum acidente na rua, não passar vergonha? Como se na hora do sufoco isso realmente fosse importante.
Cono não consegui ainda que marcas de lingerie me falassem da sua logística reversa, sigo usando as que tenho. Isso não acaba com minha imagem nem me faz uma mulher desleixada. Só não acho necessário ter que renovar meu estoque de roupa de baixo a cada seis meses, sendo que essas peças também possuem marcas inerentes ao seu uso. Não é falta de lavagem nem nada do tipo.
Aliás, desleixo. Como categorizar uma mulher como tal, só por ela optar em fazer valer seu dinheiro, se preocupar com o meio ambiente, escolher as suas prioridades e batalhas na vida? É quem não se maquia? É quem usa roupa por mais duas ou três vezes na semana sem essa necessidade de lavar o tempo todo?
Desleixo é entregar trabalho pela metade, e não avistar uma mulher que está de tênis e camiseta.
Eu estou aprendendo. Quem aqui também?
Em tempo: lendo o capítulo de trabalho do O mito da beleza. Leiam. Leiam para mulheres que vocês conhecem.
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